27/08/2014

Livro: Tenda dos Milagres

Título: Tenda dos Milagres
Autor: Jorge Amado
Ano de lançamento: 1969
Editora: Companhia das Letras
Ano da publicação deste volume: 2008
Minha Avaliação: ♥ ♥ ♥

"Para isso o fizeram Ojuobá, os olhos de Xangô"

Publicado em 1969, traduzido para dez idiomas e adaptado para o cinema e a TV, o livro Tenda dos Milagres é um grito contra o preconceito racial e religioso, um canto à miscigenação e ao sincretismo tão marcantes na obra do escritor baiano Jorge Amado.

Antes de mais nada, preciso confessar que foi uma leitura difícil na época, porque achei que faltava uma trama. É um livro meio relato histórico/jornalístico, algo assim. Foi como se o Jorge estivesse o tempo todo argumentando o mesmo ponto através de formas diferentes. É um livro que necessita muita paciência para ser lido até o fim. Mas não deixa de ser um bom livro, afinal de contas, é Jorge Amado.

Em Tenda dos Milagres, conhecemos a história de Pedro Archanjo, um mulato de muitos amores - alguns contidos em nome da amizade -, que documentou a cultura popular e provou a ascendência negra da aristocracia baiana do início do século XX.
"Na Tenda dos Milagres, na ladeira do Tabuão, em Salvador, onde o amigo Lídio Corró mantém uma modesta tipografia e pinta quadros de milagres de santos, o mulato Pedro Archanjo atua como uma espécie de intelectual orgânico do povo afro-descendente da Bahia. Autodidata, seus estudos sobre a herança cultural africana e sua defesa entusiástica da miscigenação abalam a ortodoxia acadêmica e causam indignação entre a elite branca e racista." - Companhia das Letras
A narrativa do livro é contada em dois tempo entrelaçados ao longo da história; em 1969, ano que o livro fora publicado, houve a passagem por Salvador de um célebre etnólogo norte-americano que se dizia admirador de Pedro Archanjo, e cujo propósito era conhecer a terra deste homem, autor de uns tantos livros que ele admirava, e que até então era um ilustre desconhecido de todos nós. As declarações do etnólogo logo causam alvoroço na sociedade e a imprensa sai à caça de informações sobre a vida e obra deste célebre personagem. O que o torna objeto de estudo dos eruditos de plantão e foco de não sei quantas homenagens de políticos oportunistas. Veja bem a sacada irônica de Jorge Amado: precisou vir um estrangeiro para que o Brasil conhecesse e desse valor às obras de um mulato nativo da Bahia. 

A outra parte acontece no início do século XX, e nos mostra o tal Pedro Archanjo, um mestiço, intelectual autodidata, sem formação acadêmica, mas forjado pela vida, pela vivência das ruas, pelo convívio com seu povo. Bedel da faculdade de Medicina (porque, claro, ele não podia ser mais do que isso, um negro, onde já se viu, estudar numa universidade? Pior ainda, ser professor!), é também o amigo fiel, capaz de abdicar em favor do mestre Lídio Corró, de Rosa de Oxalá, o amor de sua vida. Grande paixão, mas não é o suficiente para aquietar o coração deste homem e impedir que Pedro seja um homem de muitos amores, como atestam Kirsi, Sabina, Rosália, Dedé e tantas outras. Pedro Archanjo seria um heroi combatido pela sociedade racista, o "Ojuobá, os olhos de Xangô", e um dos muitos personagens marcantes das obras de Jorge Amado.

Por ser um homem de uma grandiosa cultura, Jorge Amado gostava de mesclar uma linguagem formal com o palavreado chulo e cheio de regionalismos do Nordeste. Assim como Tolkien lá na Inglaterra inventava 500 nomes diferentes para um mesmo personagem, Amado aqui na Bahia adorava adjetivos, um mesmo substantivo possuía vários adjetivos. Por isso mesmo que é um livro riquíssimo, muito bem escrito, que trata de um problema social da época significativo, (vide Capitães da Areia), além de contar com muito humor e passagens engraçadas, coisa que o ator adorava fazer em suas obras. Talvez seja por isso que Jorge foi e é tão Amado até hoje :) 


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